À margem do bilionário mercado da reciclagem, a coleta diária de material reciclável não é suficente para garantir o bem estar dos trabalhadores do setor. Mas, com organização e pressão sobre o poder público, os catadores já enxergam uma luz no fim do túnel
Consta no Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), do Ministério do Trabalho e Emprego, sob o código 5192, a ocupação Trabalhadores de coleta e seleção de material reciclável. Entre as descrições estão: catador de ferro-velho, papel e papelão, sucata, vasilhame, prensador, entre outros. São trabalhadores que percorrem diariamente as ruas da capital paulista e de inúmeras outras cidades no país coletando material reciclável com potencial de venda. A procura é pelos resíduos mais rendáveis, como latinhas de alumínio, papelão, papel branco e garrafas PET. De acordo com dados do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), em São Paulo, o quilo do alumínio limpo, por exemplo, custa R$ 1,80 e o do resíduo PET prensado e higienizado vale R$ 0,80.
Atualmente, existem 20 cooperativas cadastradas no site da prefeitura da capital paulista. Nelas trabalham cerca de 1.000 cooperados que, segundo a página eletrônica do governo municipal, “estavam à margem da sociedade” e conseguiram se estabelecer. Entretanto, se contrastarmos o número de catadores incluídos socialmente no processo de reciclagem - empregados em cooperativas cadastradas na cidade - com a quantidade de catadores excluídos – sujeitos ao mercado informal -, a realidade toma proporções escabrosas.
Segundo estimativa do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), existem 20 mil catadores em São Paulo. A grande maioria trabalha sem registro formal em cooperativas e centrais de triagem ou em ferros-velhos. Há também os que trabalham nas ruas, fazendo a coleta com carroças ou outros veículos, de maneira autônoma. A renda mensal média da categoria varia entre um e dois salários mínimos, às vezes até menos que o piso nacional.
Em geral, os agentes que estão na base do processo da reciclagem, como cooperados e catadores, não têm condições de negociar diretamente com as grandes empresas da reciclagem. Para fazer isso eles precisariam se estabelecer como empresa ou firma, e prestar contas ao fisco. Também necessitariam aumentar o volume de material coletado, já que a grande indústria não compra em pequenas quantidades. É aí que entra a figura do intermediário, aparista ou sucateiro – a depender da região do país. É ele quem compra o material reciclável de cooperativas menores, ferros-velhos e catadores autônomos e comercializa esse material com as grandes empresas, extraindo daí seu lucro.
No entanto, muitas vezes a relação de trabalho entre cooperativas de catadores e atravessadores se torna de exploração. Excluídos do negócio, que movimenta R$ 12 bilhões por ano no Brasil, trabalhadores são obrigados a vender seu material de coleta a preços irrisórios ou em troca de um prato de comida. Sem contar quando se submetem a condições subumanas para garantir o sustento de suas famílias e acabam contraindo dívidas financeiras e “morais” com esses atravessadores. Em inúmeras vezes tal situação pode ser caracterizada como regime de servidão por dívida, crime previsto no artigo 149 do Código Penal que caracteriza a redução da pessoa à “condição análoga à de escravo”.
“A exploração vem através do sufoco de cada trabalhador. Às vezes a pessoa está desempregada e necessita vender seu material para comer. Isso é inaceitável. Essa condição faz com que ele seja explorado e tenha seus direitos
violados”, explica Eduardo Ferreira. Carlos Weis, coordenador do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, relaciona a constante violação da dignidade dos catadores também a uma conduta discriminatória por parte da sociedade. “Esse preconceito muitas vezes se traduz em casos de violência e violação da integridade física dessas pessoas”, argumenta.
Cooperativa da Granja Julieta: uma bandeira de luta dos catadores
O trabalho dos catadores de material reciclável os expõe a condições precárias e oferece sérios riscos a saúde. A jornada diária vai de dez a doze horas diárias. Dentro de aterros e cooperativas, eles estão sujeitos a perfurações no manuseio de materiais cortantes, contato direto com lixo hospitalar, queimaduras, quedas, contusões e atropelamentos, no caso dos que trabalham na rua.
Maria Vera da Cruz é médica e há quase um ano ela acompanha as questões de saúde da cooperativa Nossos Valores, no bairro da Granja Julieta, zona sul de São Paulo, e faz o encaminhamento médico de cooperados que adoeceram ou se feriram por conta das condições de trabalho. “As condições aqui são muito insalubres. O material fica exposto às condições climáticas e vira um criadouro de agentes de doença. A cooperativa é um local de trabalho como qualquer outro. Mas ela não tem as condições adequadas para isso”, defende. [Hiperlink: A situação de precariedade na qual trabalham não se restringe apenas a São Paulo. Em fevereiro do ano passado, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) publicou um estudo a respeito das condições de trabalho de catadores da comunidade de São José do Coque, em Recife (PE). A pesquisa concluiu que os trabalhadores não têm dinheiro para investir em proteção e acabam tendo contato direito com materiais contaminados.]
O emblemático caso da Granja Julieta é um dos exemplos da luta dos catadores de todo o país contra o descaso das autoridades governamentais em relação à elaboração e execução de políticas públicas para o setor. Na madrugada do dia 9 de dezembro de 2008, a Nossos Valores teve seu galpão incendiado. Situada numa região de forte especulação imobiliária na cidade de São Paulo, a causa do incêndio levantou suspeitas. “Tentaram acabar com a cooperativa. A polícia assumiu o caso e não apurou nada dentro das vias legais. Com muito sacrifício, um ano depois conseguimos, junto à prefeitura, restabelecer a cooperativa em condições provisórias em um terreno próximo”, esclarece Cássio Loureiro, advogado voluntário da cooperativa.
Na ida da reportagem de Fórum à Nossos Valores, um rato morto foi encontrado dentro de um dos sacos deixado pelo caminhão da EcoUrbis no local. A cooperada Angelita diz que a empresa não faz a seleção dos resíduos que coleta e deixa o trabalho a cargo dos cooperados. “Não é nossa função. A EcoUrbis deixa o material de qualquer jeito, sem selecionar nada. Ela traz o inservível pra nós, o lixo. Hoje há um rato dentro do saco. Noutro dia tinha um cachorro morto também”
Até hoje, a prefeitura de São Paulo não realocou a cooperativa, que funciona em um terreno sem a mínima estrutura em Santo Amaro, zona sul paulistana. Não há empilhadeiras para erguer os blocos de papelão, que pesam quase meia tonelada, e o pátio não é coberto, o que impossibilita o trabalho em dias de chuva. O galpão – esse sim coberto –, que abriga a única mesa de triagem, não possui ventilação suficiente. Após apelo público do ex-presidente Lula, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), visitou a cooperativa no final de 2009. “Se Deus quiser, dentro de poucas semanas vocês estarão numa nova área”, prometeu o prefeito. Até hoje, nada foi feito.
Mara Lúcia, presidente da Nossos Valores, conta que, desde a visita de Kassab, vem cobrando junto à administração paulistana o compromisso selado pelo prefeito. “Eu já falei com o governo municipal, estadual e até com o presidente Lula. Não existe na política brasileira quem não conheça o caso da Granja Julieta. Mesmo assim ninguém resolve. Todos estão sabendo do descaso da prefeitura com a cooperativa”, denunciou. Tamanha mobilização em garantir condições dignas de trabalho a seus cooperados chamou a atenção do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que aderiu à causa. “Eu e Mara estivemos numa audiência com o prefeito Kassab no final de janeiro deste ano, onde ficou acertado que a cooperativa será transferida para um terreno de aproximadamente 500 m² próximo dali”, relatou. Resta à Nossos Valores acreditar na palavra de Kassab. E pressionar.
A – falta de – postura da prefeitura de São Paulo
Dentre as muitas lacunas existentes na questão da coleta seletiva em São Paulo, o prefeito também não justificou porque os R$ 5,965 milhões disponibilizados pelo Ministério das Cidades em maio de 2008, através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ainda não foram usadospara a construção de dez novas centrais de reciclagem na cidade. O dinheiro está até hoje na conta da Caixa Econômica Federal à disposição da Limpurb.
O investimento certamente valeria à pena, visto que o trabalho dos catadores é fundamental para que o sistema de coleta seletiva de São Paulo não sofra um colapso. Das 17 mil toneladas de resíduos que chegam às ruas da capital paulista diariamente, 4 mil (23,5% do total) são coletadas pelos 20 mil catadores – autônomos e cooperados, que percorrem a cidade com carroças, caminhões, ou até mesmo a pé.
Integrante da Subcomissão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, o vereador Ítalo Cardoso (PT-SP) defende o trabalho feito pelos catadores e destaca sua importância para a cidade. “A prefeitura não tem suporte para tratar desse problema. Se eles resolvessem parar com as atividades, você ia ver o caos que ia virar essa cidade. O poder municipal dá um tratamento desumano, antidemocrático e preconceituoso aos catadores da cidade”, diz. Cardoso cobra também o não uso da verba do PAC. “A prefeitura já poderia ter usado a verba federal no setor de reciclagem e não o fez. Ela sabe da importância dos catadores para a cidade, mas os tratam de forma marginal”, cobra.
Avanços e perspectivas
Em âmbito nacional, as perspectivas são de melhora na realidade dos catadores. Após uma aproximação feita com o ex-presidente Lula, que realizava encontros de fim de ano com a categoria desde seu primeiro mandato, a categoria volta suas atenções para o governo de Dilma Rousseff. Continuidade e mais atenção são as expectativas de Eduardo Ferreira, do MNCR, para o governo da presidente eleita. “A expectativa é muito boa. Esperamos que ela tenha uma relação transparente conosco e faça um governo exemplar”, diz.
As políticas nacionais para a categoria começaram a ser implementadas em 1998, com a primeira edição do Fórum Nacional Lixo e Cidadania – apoiado pelo Unicef. O evento incentivou a discussão de políticas nacionais para a população em situação de rua no Brasil. Mas a principal conquista da categoria desde essa data foi a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305, de 2 de agosto de 2010) e a criação do Programa Pró-Catador, a partir do Decreto Federal nº 7.405, de 23 de dezembro de 2010.
“A nova legislação reconhece o catador como um ator da gestão dos resíduos sólidos. Isso faz toda a diferença. Nesse momento, temos portas abertas para a inclusão dos grupos de catadores”, defende Jaira Pupim, coordenadora do Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores de Materiais Recicláveis (CIISC).
Além da PNRS, o governo federal também está articulando medidas para promover melhoras no setor. É o caso da aprovação do programa Pró-Catador, que tem por objetivo estimular a organização produtiva de catadores de materiais recicláveis, garantir melhorias nas condições de trabalho e ampliar as oportunidades de inclusão social e econômica da categoria, através do estímulo à coleta seletiva de resíduos sólidos no país. De acordo com o decreto, o programa poderá se articular com poder estadual e municipal – além do federal, a fim de captar recursos para o investimento em capacitação profissional e estrutural de cooperados e cooperativas. A luz no fim do túnel para a melhora das condições dos catadores existe. Mas certamente sua luta não vai terminar tão cedo.
Por André Rossi
Consta no Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), do Ministério do Trabalho e Emprego, sob o código 5192, a ocupação Trabalhadores de coleta e seleção de material reciclável. Entre as descrições estão: catador de ferro-velho, papel e papelão, sucata, vasilhame, prensador, entre outros. São trabalhadores que percorrem diariamente as ruas da capital paulista e de inúmeras outras cidades no país coletando material reciclável com potencial de venda. A procura é pelos resíduos mais rendáveis, como latinhas de alumínio, papelão, papel branco e garrafas PET. De acordo com dados do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), em São Paulo, o quilo do alumínio limpo, por exemplo, custa R$ 1,80 e o do resíduo PET prensado e higienizado vale R$ 0,80.
Atualmente, existem 20 cooperativas cadastradas no site da prefeitura da capital paulista. Nelas trabalham cerca de 1.000 cooperados que, segundo a página eletrônica do governo municipal, “estavam à margem da sociedade” e conseguiram se estabelecer. Entretanto, se contrastarmos o número de catadores incluídos socialmente no processo de reciclagem - empregados em cooperativas cadastradas na cidade - com a quantidade de catadores excluídos – sujeitos ao mercado informal -, a realidade toma proporções escabrosas.
Segundo estimativa do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), existem 20 mil catadores em São Paulo. A grande maioria trabalha sem registro formal em cooperativas e centrais de triagem ou em ferros-velhos. Há também os que trabalham nas ruas, fazendo a coleta com carroças ou outros veículos, de maneira autônoma. A renda mensal média da categoria varia entre um e dois salários mínimos, às vezes até menos que o piso nacional.
Em geral, os agentes que estão na base do processo da reciclagem, como cooperados e catadores, não têm condições de negociar diretamente com as grandes empresas da reciclagem. Para fazer isso eles precisariam se estabelecer como empresa ou firma, e prestar contas ao fisco. Também necessitariam aumentar o volume de material coletado, já que a grande indústria não compra em pequenas quantidades. É aí que entra a figura do intermediário, aparista ou sucateiro – a depender da região do país. É ele quem compra o material reciclável de cooperativas menores, ferros-velhos e catadores autônomos e comercializa esse material com as grandes empresas, extraindo daí seu lucro.
No entanto, muitas vezes a relação de trabalho entre cooperativas de catadores e atravessadores se torna de exploração. Excluídos do negócio, que movimenta R$ 12 bilhões por ano no Brasil, trabalhadores são obrigados a vender seu material de coleta a preços irrisórios ou em troca de um prato de comida. Sem contar quando se submetem a condições subumanas para garantir o sustento de suas famílias e acabam contraindo dívidas financeiras e “morais” com esses atravessadores. Em inúmeras vezes tal situação pode ser caracterizada como regime de servidão por dívida, crime previsto no artigo 149 do Código Penal que caracteriza a redução da pessoa à “condição análoga à de escravo”.
“A exploração vem através do sufoco de cada trabalhador. Às vezes a pessoa está desempregada e necessita vender seu material para comer. Isso é inaceitável. Essa condição faz com que ele seja explorado e tenha seus direitos
violados”, explica Eduardo Ferreira. Carlos Weis, coordenador do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, relaciona a constante violação da dignidade dos catadores também a uma conduta discriminatória por parte da sociedade. “Esse preconceito muitas vezes se traduz em casos de violência e violação da integridade física dessas pessoas”, argumenta.
Cooperativa da Granja Julieta: uma bandeira de luta dos catadores
O trabalho dos catadores de material reciclável os expõe a condições precárias e oferece sérios riscos a saúde. A jornada diária vai de dez a doze horas diárias. Dentro de aterros e cooperativas, eles estão sujeitos a perfurações no manuseio de materiais cortantes, contato direto com lixo hospitalar, queimaduras, quedas, contusões e atropelamentos, no caso dos que trabalham na rua.
Maria Vera da Cruz é médica e há quase um ano ela acompanha as questões de saúde da cooperativa Nossos Valores, no bairro da Granja Julieta, zona sul de São Paulo, e faz o encaminhamento médico de cooperados que adoeceram ou se feriram por conta das condições de trabalho. “As condições aqui são muito insalubres. O material fica exposto às condições climáticas e vira um criadouro de agentes de doença. A cooperativa é um local de trabalho como qualquer outro. Mas ela não tem as condições adequadas para isso”, defende. [Hiperlink: A situação de precariedade na qual trabalham não se restringe apenas a São Paulo. Em fevereiro do ano passado, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) publicou um estudo a respeito das condições de trabalho de catadores da comunidade de São José do Coque, em Recife (PE). A pesquisa concluiu que os trabalhadores não têm dinheiro para investir em proteção e acabam tendo contato direito com materiais contaminados.]
O emblemático caso da Granja Julieta é um dos exemplos da luta dos catadores de todo o país contra o descaso das autoridades governamentais em relação à elaboração e execução de políticas públicas para o setor. Na madrugada do dia 9 de dezembro de 2008, a Nossos Valores teve seu galpão incendiado. Situada numa região de forte especulação imobiliária na cidade de São Paulo, a causa do incêndio levantou suspeitas. “Tentaram acabar com a cooperativa. A polícia assumiu o caso e não apurou nada dentro das vias legais. Com muito sacrifício, um ano depois conseguimos, junto à prefeitura, restabelecer a cooperativa em condições provisórias em um terreno próximo”, esclarece Cássio Loureiro, advogado voluntário da cooperativa.
Na ida da reportagem de Fórum à Nossos Valores, um rato morto foi encontrado dentro de um dos sacos deixado pelo caminhão da EcoUrbis no local. A cooperada Angelita diz que a empresa não faz a seleção dos resíduos que coleta e deixa o trabalho a cargo dos cooperados. “Não é nossa função. A EcoUrbis deixa o material de qualquer jeito, sem selecionar nada. Ela traz o inservível pra nós, o lixo. Hoje há um rato dentro do saco. Noutro dia tinha um cachorro morto também”
Até hoje, a prefeitura de São Paulo não realocou a cooperativa, que funciona em um terreno sem a mínima estrutura em Santo Amaro, zona sul paulistana. Não há empilhadeiras para erguer os blocos de papelão, que pesam quase meia tonelada, e o pátio não é coberto, o que impossibilita o trabalho em dias de chuva. O galpão – esse sim coberto –, que abriga a única mesa de triagem, não possui ventilação suficiente. Após apelo público do ex-presidente Lula, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), visitou a cooperativa no final de 2009. “Se Deus quiser, dentro de poucas semanas vocês estarão numa nova área”, prometeu o prefeito. Até hoje, nada foi feito.
Mara Lúcia, presidente da Nossos Valores, conta que, desde a visita de Kassab, vem cobrando junto à administração paulistana o compromisso selado pelo prefeito. “Eu já falei com o governo municipal, estadual e até com o presidente Lula. Não existe na política brasileira quem não conheça o caso da Granja Julieta. Mesmo assim ninguém resolve. Todos estão sabendo do descaso da prefeitura com a cooperativa”, denunciou. Tamanha mobilização em garantir condições dignas de trabalho a seus cooperados chamou a atenção do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que aderiu à causa. “Eu e Mara estivemos numa audiência com o prefeito Kassab no final de janeiro deste ano, onde ficou acertado que a cooperativa será transferida para um terreno de aproximadamente 500 m² próximo dali”, relatou. Resta à Nossos Valores acreditar na palavra de Kassab. E pressionar.
A – falta de – postura da prefeitura de São Paulo
Dentre as muitas lacunas existentes na questão da coleta seletiva em São Paulo, o prefeito também não justificou porque os R$ 5,965 milhões disponibilizados pelo Ministério das Cidades em maio de 2008, através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ainda não foram usadospara a construção de dez novas centrais de reciclagem na cidade. O dinheiro está até hoje na conta da Caixa Econômica Federal à disposição da Limpurb.
O investimento certamente valeria à pena, visto que o trabalho dos catadores é fundamental para que o sistema de coleta seletiva de São Paulo não sofra um colapso. Das 17 mil toneladas de resíduos que chegam às ruas da capital paulista diariamente, 4 mil (23,5% do total) são coletadas pelos 20 mil catadores – autônomos e cooperados, que percorrem a cidade com carroças, caminhões, ou até mesmo a pé.
Integrante da Subcomissão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, o vereador Ítalo Cardoso (PT-SP) defende o trabalho feito pelos catadores e destaca sua importância para a cidade. “A prefeitura não tem suporte para tratar desse problema. Se eles resolvessem parar com as atividades, você ia ver o caos que ia virar essa cidade. O poder municipal dá um tratamento desumano, antidemocrático e preconceituoso aos catadores da cidade”, diz. Cardoso cobra também o não uso da verba do PAC. “A prefeitura já poderia ter usado a verba federal no setor de reciclagem e não o fez. Ela sabe da importância dos catadores para a cidade, mas os tratam de forma marginal”, cobra.
Avanços e perspectivas
Em âmbito nacional, as perspectivas são de melhora na realidade dos catadores. Após uma aproximação feita com o ex-presidente Lula, que realizava encontros de fim de ano com a categoria desde seu primeiro mandato, a categoria volta suas atenções para o governo de Dilma Rousseff. Continuidade e mais atenção são as expectativas de Eduardo Ferreira, do MNCR, para o governo da presidente eleita. “A expectativa é muito boa. Esperamos que ela tenha uma relação transparente conosco e faça um governo exemplar”, diz.
As políticas nacionais para a categoria começaram a ser implementadas em 1998, com a primeira edição do Fórum Nacional Lixo e Cidadania – apoiado pelo Unicef. O evento incentivou a discussão de políticas nacionais para a população em situação de rua no Brasil. Mas a principal conquista da categoria desde essa data foi a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305, de 2 de agosto de 2010) e a criação do Programa Pró-Catador, a partir do Decreto Federal nº 7.405, de 23 de dezembro de 2010.
“A nova legislação reconhece o catador como um ator da gestão dos resíduos sólidos. Isso faz toda a diferença. Nesse momento, temos portas abertas para a inclusão dos grupos de catadores”, defende Jaira Pupim, coordenadora do Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores de Materiais Recicláveis (CIISC).
Além da PNRS, o governo federal também está articulando medidas para promover melhoras no setor. É o caso da aprovação do programa Pró-Catador, que tem por objetivo estimular a organização produtiva de catadores de materiais recicláveis, garantir melhorias nas condições de trabalho e ampliar as oportunidades de inclusão social e econômica da categoria, através do estímulo à coleta seletiva de resíduos sólidos no país. De acordo com o decreto, o programa poderá se articular com poder estadual e municipal – além do federal, a fim de captar recursos para o investimento em capacitação profissional e estrutural de cooperados e cooperativas. A luz no fim do túnel para a melhora das condições dos catadores existe. Mas certamente sua luta não vai terminar tão cedo.
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