Pierre Rosanvallon
em: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21322
A igualdade ocupou o centro de minha reflexão intelectual para pôr fim a uma visão de progresso social percebida unicamente a partir do tema da igualdade de possibilidades. Está claro que a igualdade de possibilidades não existe mais. A ideologia do mérito, da virtude, da igualdade de possibilidades, não pode servir para reconstruir sociedades. Por isso critiquei as chamadas teorias da justiça, Essas teorias, inclusive entre aqueles que apresentam sua versão mais progressista, como o prêmio Nobel de Economia Amartya Sem ou John Rawls, seguem inscritas em uma filosofia das desigualdades aceitáveis enquanto essas desigualdades estejam articuladas em torno do mérito, da ação do indivíduo.
Esse não é o modelo da boa sociedade. O modelo da boa sociedade não é a meritocracia. O bom modelo é o da sociedade dos iguais entendida no sentido de uma sociedade de relação entre os indivíduos, uma relação fundada sobre a igualdade. Temos a impressão de que a noção de igualdade de possibilidades, sobretudo se a definimos de forma radical, pode ser uma visão de esquerda. Todo o combate político se joga entre a definição mínima e a definição radical da ideia de igualdade de possibilidades. Eu digo que é preciso desconfiar dessa ideia de igualdade de possibilidades porque se vamos até suas últimas consequências terminamos por justificar as desigualdades e também justificar a falta de reação contra as desigualdades na medida em que estas foram legitimadas.
O grande sociólogo britânico Michael Young foi o primeiro a falar nos anos 60 da meritocracia, que é um velho ideal dos séculos XVIII e XIX. Young definia como um pesadelo todo país que fosse governador pela meritocracia. E é um pesadelo porque, neste caso, ninguém teria direito a protestar contra as diferenças. Se todas as diferenças estão fundadas sobre o mérito, aquele tem uma condição inferior a tem por culpa própria. Trata-se então de uma sociedade onde a crítica social não teria mais lugar.
É preciso ter consciência do limite do ideal meritocrático, do limite das teorias da justiça, do limite das políticas sobre a igualdade das possibilidades. Mesmo que essas políticas tenham seu espaço de validade, elas não representam a bússola que deve orientar uma sociedade para sua transformação.
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A igualdade ocupou o centro de minha reflexão intelectual para pôr fim a uma visão de progresso social percebida unicamente a partir do tema da igualdade de possibilidades. Está claro que a igualdade de possibilidades não existe mais. A ideologia do mérito, da virtude, da igualdade de possibilidades, não pode servir para reconstruir sociedades. Por isso critiquei as chamadas teorias da justiça, Essas teorias, inclusive entre aqueles que apresentam sua versão mais progressista, como o prêmio Nobel de Economia Amartya Sem ou John Rawls, seguem inscritas em uma filosofia das desigualdades aceitáveis enquanto essas desigualdades estejam articuladas em torno do mérito, da ação do indivíduo.
Esse não é o modelo da boa sociedade. O modelo da boa sociedade não é a meritocracia. O bom modelo é o da sociedade dos iguais entendida no sentido de uma sociedade de relação entre os indivíduos, uma relação fundada sobre a igualdade. Temos a impressão de que a noção de igualdade de possibilidades, sobretudo se a definimos de forma radical, pode ser uma visão de esquerda. Todo o combate político se joga entre a definição mínima e a definição radical da ideia de igualdade de possibilidades. Eu digo que é preciso desconfiar dessa ideia de igualdade de possibilidades porque se vamos até suas últimas consequências terminamos por justificar as desigualdades e também justificar a falta de reação contra as desigualdades na medida em que estas foram legitimadas.
O grande sociólogo britânico Michael Young foi o primeiro a falar nos anos 60 da meritocracia, que é um velho ideal dos séculos XVIII e XIX. Young definia como um pesadelo todo país que fosse governador pela meritocracia. E é um pesadelo porque, neste caso, ninguém teria direito a protestar contra as diferenças. Se todas as diferenças estão fundadas sobre o mérito, aquele tem uma condição inferior a tem por culpa própria. Trata-se então de uma sociedade onde a crítica social não teria mais lugar.
É preciso ter consciência do limite do ideal meritocrático, do limite das teorias da justiça, do limite das políticas sobre a igualdade das possibilidades. Mesmo que essas políticas tenham seu espaço de validade, elas não representam a bússola que deve orientar uma sociedade para sua transformação.
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